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Divórcios abaixo da média. Mas os números não refletem o que se passa dentro das paredes de casa

Divórcios abaixo da média. Mas os números não refletem o que se passa dentro das paredes de casa

 

O “boom” que se esperava nunca chegou a acontecer. Durante todo o ano da pandemia, os divórcios mantiveram-se abaixo da média dos últimos anos. Especialistas continuam a notar um número muito superior de pedidos de informação e de processos submetidos. Então, o que explica o fenómeno?

 

De outubro de 2020 a março de 2021, em nenhum mês o número de divórcios foi superior ao da média dos últimos três anos. É preciso recuar a setembro (1353 divórcios) para encontrar mais separações do que no mês homólogo dos anos anteriores - e por pouco (apenas nove casos a mais).

 

Fevereiro chegou como o mês com menos divórcios do último semestre: 546, (enquanto a média dos últimos três fevereiros é de 1290). Neste mês, Portugal esteve mergulhado no segundo confinamento geral, com as conservatórias e tribunais a funcionarem apenas a meio gás. O mesmo fenómeno já se tinha observado em abril de 2020. Também aí o país enfrentava um confinamento e, dessa vez, com uma interrupção quase total dos serviços, só se oficializaram 181 separações.

 

Desde o início da pandemia que apenas no terceiro trimestre de 2020, de julho a setembro, houve um aumento tímido de divórcios (mais 235) face ao mesmo período de 2019, num total de 3862.

 

Os números parecem contradizer o que é observado no terreno pelos advogados com especialização em direito de família, ao anunciarem um aumento de três vezes mais pedidos de esclarecimento e de processos submetidos.

 

Atraso nos tribunais e falta de condições económicas podem explicar o fenómeno

 

“Efetivamente, os números não correspondem ao aumento médio de serviços que temos tido desde que começou o confinamento”, começa por contextualizar o advogado Ricardo Candeias, especializado em divórcio. Entre entradas de processos de divórcio, consultas para esclarecimentos e alterações da regulação das responsabilidades parentais, estima ter três vezes mais trabalho, sem perder tempo a atirar as justificações.

 

“As pessoas querem divorciar-se”, reconhece, mas, muitas vezes, a negociação e formalização do divórcio “demora mais do que pensam”. Em parte, pelos atrasos que a paragem das conservatórias e dos tribunais provoca, diz a advogada Ângela Vieira, de direito da família, admitindo que “acabou por ser um travão”. Mas também na sua experiência no dia a dia, a par do que já tinha relatado ao Expresso nos primeiros meses de pandemia, continua “a registar um aumento significativo do número de pedidos de orientação em assuntos relacionados com processos de divórcio, por comparação com os anos anteriores”.

 

Nota que, para muitos casais, “o confinamento marcou um ponto de rutura no casamento, ao tornar mais evidentes algumas incompatibilidades”. Mas, por outro lado, “a incerteza profissional, a diminuição das condições económicas e a própria imprevisibilidade dos próximos tempos também levam algumas pessoas a adiar este tipo de decisão, atendendo ao impacto financeiro que o divórcio tem necessariamente na vida de cada um”, acrescenta a advogada.

 

A psicóloga clínica e presidente do Instituto de Apoio à Criança, Fernanda Salvaterra, notou que “o impacto foi maior em famílias cujo funcionamento já estava em desequilíbrio, tendo a conflitualidade se agravado e reduzido a sua capacidade de adaptação às novas circunstâncias”.

 

Ricardo Candeias tem encontrado pessoas que “estão de facto separadas mas vivem na mesma casa, a maioria das vezes por não terem condições económicas para se mudarem” ou então já vivem separadas mas não põem fim imediato ao casamento, “dão antes prioridade ao tema dos filhos”.

 

Com “uma grande incerteza quanto ao futuro, muitos dos seus clientes fazem “muitas perguntas e mais do que uma vez”. Mas admite, tal como Ângela, que, com a retoma progressiva da atividade nos tribunais e das conservatórias, os números aumentem progressivamente.

 

 Fonte: Expresso

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